Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Sobre panetones, selfies e farofa


 Sempre que dezembro chega por aqui, traz consigo um saco cheio de animosidades. O Amor é negociado como moeda de troca, e no mercado de hoje parecemos tão pobres, carentes e necessitados. A palavra da moda é Ostentação e a felicidade banalizada em selfies cada vez mais ensaiadas onde o verdadeiro eu quase sempre fica oculto. Dezembro só nos permite felicidade, mesmo que apenas para ser exibida de maneira tão irreal, são apenas sorrisos forçados de um bando de gente que corre apressada e sem paciência para conseguir o melhor presente, o maior peru, o espumante mais gelado e o panetone mais recheado. Para que? Se nessas festas o presente nunca será bom o bastante, o tempero do peru nunca estará ao agrado de todos e o panetone coitado sempre sobra. Quem tem fome de verdade não tem festa alguma para ir.

 Papai Noel, se estiveres ouvindo traga um pouco de coerência. Ho Ho Ho

Os mais otimistas, os sempre alegres dirão que isso pareceu Amargo. E amargo é querer que tudo isso acabe logo, e que logo passem também as festas de ano novo, porque as benção da crença de que tudo será perfeito no ano que se inicia também não caíram sobre mim. Quero logo que chegue a nova estação e que folhas secas e amareladas cubram o chão, para que eu finalmente acredite que a vida voltou ao seu leito normal. E que esses que emanam essa aura de urgência em ser feliz agora sejam engolidos por toda essa loucura que paira no ar quente de seu sorridente dezembro.

Eu quero abraços sinceros independente de datas, quero sempre que puder, dar um presente bonito a alguém, qualquer dia do ano, pelo simples fato de estar feliz de verdade, ou pelo desejo genuíno de querer despertar um sorriso no rosto de um ser querido. Quero estender uma toalha bonita na mesa pela gratidão de uma vida simples. Quero que queiram estar comigo, na desobrigação de qualquer data maior do que o desejo de estar na presença de outrem. Não quero ter um roteiro ou um protocolo a seguir. 

Que as crianças entendam que Papai Noel é só a representação de um Amor que pode existir durante um ano inteiro. Um desejo de Natal diário e contínuo, uma fonte inesgotável de pequenos gestos. Uma rotina de gratidão e renovação, porque perdão também acontece ao acaso, mesmo que não tenhamos participado da ceia. 

 Eu creio na fidelidade consigo mesmo. Da mesmo forma que quero que para mim tudo isso acabe logo, desejei sempre que a verdade de cada um seja sempre bonita e respeitada, se for importante exteriorizar, que se faça. Se a comemoração é indispensável, que cada qual saiba o que mais lhe agrada na sua farofa. Mas que me seja permitido não participar.

De resto, só acho que panetone combina muito mais com café quente no inverno.



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Coloque uma margarida nessa pulseira, vou gostar.