Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

sábado, 20 de abril de 2013

Envelope Azul

Estava com saudades de escrever sobre os livros que li, e casualmente nesse período que fiquei sem escrever li muitos.

Em uma quinta-feira comum recebo inesperadamente um envelope grande, azul, bonito. Era metade da manhã e dentro do envelope estava uma edição incrível de Olhai os Lírios do Campo. Uma edição especial de 73. Adquirido em um sebo, não tem dedicatória, mas havia tanto carinho naquele presente que entrou automaticamente na lista de coisas mais bonitas.

Presente de um grande amigo que está morando em Santa Catarina. Gaúcho, gentil, culto, inteligente, sensível e gremista. Grande entendedor de músicas e cozinheiro. E com um gosto impecável para presentes.

Sobre o livro: Muito já foi escrito e resenhado sobre ele, enfim eu apenas acrescentaria: Não deixe de ler Veríssimo.



Um dos trechos de que mais gosto de uma das cartas escritas por Olívia:

" Procurar nossa felicidade através da felicidade dos outros - aconselhava Olívia noutra carta sem data - Não estou pregando o ascetismo, a santidade, não estou elogiando o puro espírito de sacrifício e renúncia. Tudo isso seria inumano, significaria ainda uma fuga da vida. Mas o que procuro, o que desejo é segurar a vida pelos ombros e estreitá-la contra o peito, beijá-la na face. Vida, entretanto, não é o ambiente em que te achas. As maneiras estudadas, frases convencionais, excesso de conforto, os perfumes caros e a preocupação de dinheiro são apenas uma péssima contrafração da vida. Buscar a poesia da vida fora da vida será coisa que tenha nexo? "

Outras passagens bonitas:

"- E agora? - perguntou Eugênio.
Olívia encolheu os ombros.
- A vida continua.
- Eu sei... Mas é nós? 
- Continuamos também."

" - Há dias inesquecíveis na vida da gente. "

" Aquela noite era um mundo, aquela noite era uma eternidade, ele nunca, nunca mais teria de esquecê-la."

" - Pouco ou muito açúcar?
- Assim está bem. 
Ela lhe passou a xícara.
- Biscoito?
- Obrigado.
Serviu-se.
- Está bom?
Ele sacudiu a cabeça afirmativamente e logo após perguntou:
- Pode-se molhar o biscoito no chá?
- E lamber os dedos se quiseres."

" - Olívia, tu... tu me amavas?
- Cego! "

O trecho final da última carta escrita: 

" Antes que me esqueça, na gaveta da cômoda há um maço de cartas que te escrevi de Nova Itália expressamente " para não te mandar". Agora podes lê-las todas. Não encontrarás nada do meu passado, do qual nunca te falei e sobre o qual tiveste a delicadeza de não fazer perguntas. É uma pena. Gostaria que soubesses tudo, que visses como minha vida já foi feia e escura e como lutei e sofri para encontrar a tranquilidade, a paz de Deus.
  Adeus. Sempre aborreci as cartas de romance que terminavam de modo patético. Mas permite que eu escreva.
                                                                               Tua para a eternidade.
                                                                                                                          Olívia."

Quando Carlos Alberto Iannone escreve sobre a obra de Veríssimo fala: Olhai os Lírios do Campo é uma história " de ternura e compreensão humana através do amor ". Ele tem razão.







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Coloque uma margarida nessa pulseira, vou gostar.