Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

sábado, 19 de janeiro de 2013

Três meses quase dois


  Um medo ambíguo, era essa a definição adequada para o sentimento que experimentei durante anos. Esperava que não acontecesse jamais e ao mesmo tempo temia que nunca fosse acontecer.

  Era absolutamente assustadora a ideia de ser dominada por um sentimento que me fizesse perder a razão ou a coerência, depois sentia uma sensação de vazio junto com o alívio pelo suposto controle das emoções, temendo viver sem nunca ter provado o que é na maioria das vezes descrito como belo.

  Sempre vi os apaixonados como bobos e alucinados; acreditava na racionalidade; em buscar de alguém que se encaixasse no meu padrão pré determinado de pessoa especial. ( Fiz até uma lista com esses itens ).

  Alguém que gostasse muito de ler, com um bom gosto musical, que usasse camiseta branca e calça jeans lisa, que deixasse a barba por fazer algumas vezes, que soubesse escolher um bom vinho, preferisse o inverno ao verão, gostasse de cachorros e crianças. Alguém com uma individualidade bastante forte. Que tivesse pontos de vista diferentes dos meus, que gostasse de dormir e de cafés, que já tivesse viajado bastante e quisesse dividir alguns lugares e conhecer tantos outros.

  Bastava ser simples, sem carências absurdas e sem necessidade de complementos. Apenas uma companhia agradável e que fosse capaz de tolerar alguns momentos de silêncio demorado. Todo medo esconde sua causa nem sempre abstrata e algumas coisas devem permanecer guardadas.

  Penso que me reservei, talvez por um tempo suficiente para entender que todos os esforços racionais são inúteis e inválidos quando se trata de uma paixão. Não uma paixão avassaladora e cega que tanto me assustava, e sim um sentimento de bem querer; querer estar junto, perto. Querer dividir as novidades, encontrar a parte boa do dia, passar a madrugada conversando e nem ver o tempo passar, fazer planos de um futuro bonito.

  Planejar dividir livros, músicas, filmes, espaços, imaginar o amparo na hora difícil, a cumplicidade. Criar até soluções para as eventuais discussões e os " emburramentos ".

  Superei meu medo. Vivi o sentimento da maneira que sabia. Fiz o que me pareceu ser o melhor para ambos. Uma quase paixão? Talvez. Um quase amor? Poderia ter sido. Gosto de pensar que nos conhecemos na estação errada, amores de verão são rotulados com passageiros, superficiais e frágeis.

  Nos demos três meses, vivemos quase dois, e isso é muito para quem nunca teve um dia inteiro. O que fica é um sentimento de gratidão ao próprio sentimento. Ficou uma saudade enorme também, mas isso seria assunto para um outro texto, talvez no outono!


  

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