Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Dylânica


Quando pele de cão não escreve ficam dois vazios: a folha e minha obsessão. Entre cada linha escrita algo de dolorido e intenso, tuas viagens internas são sempre meio mórbidas e umedecidas de água e um sal que não desmancha, queria ler cada pensamento antes de chegar ao grafite; antecipações. Procuro por teus vestígios em quase tudo que leio; o cigarro que parece nunca apagar. O cheiro da fumaça por entre teus dentes marcados de nicotina conseguem encontrar sabedoria no ato de fumar, eu imagino só o encantamento, ou uma espécie de hipnose. Ele habita outro universo; distanciamentos. Em comum, apenas a paixão por escrever, algo no gosto musical e bastante dos sentimentalismos; sazonalidades. Apenas pretensão minha; muita pretensão. É que existe muito de nostalgia na chuva de hoje.

( não te molhes, ainda que pareça ter chegado teu verão, faz frio aqui perto da velha ponte de ferro.)




sábado, 15 de setembro de 2012

Marcador de páginas


Tanto tempo longe de casa. A música quando toca na rádio é distante como o lugar  onde perdemos as chaves; não tem como sentir o vento sem lembrar da ponte que sempre engolia as águas passantes, elas também nunca completam seu curso, sempre são outras águas, mas a ponte é sempre a mesma. Não existe mais o atalho. Sinto algumas vezes inveja dessa coisa simples de poder não existir mais, parece tão seguro. Não existir deve ser um bom lugar para se estar em dias como amanhã.  Podia começar hoje; deixar o livro aberto ou com páginas marcadas é cruel com as histórias de dentro, deveria estar intacto, sagrado, onde tudo contém e não está inserido em nada; palavras libertas. Será que as palavras realmente buscam algo? Será que elas têm entendimento das sensações que causam? Queria poder pensar em sânscrito enquanto busco quebrar o cadeado.

( eu teria usado o plural se entre as palavras existisse alguma racionalidade em tentar evitar os acorrentamentos )


quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Da inutilidade que tem a memória


O mundo agora cobra esforços maiores, por isso demoro mais até chegar aqui. Nunca um inverno foi tão quente na serra, falta algo na chuva. Pouco provável que tenhamos boas notícias antes de mudar a estação. Setembro sempre é um mês melhor, e esquecer o agosto é questão obrigatória. Estranho ter que lembrar os nomes de tudo sempre, não deve ser natural essa coisa de excessos. De qualquer forma tu não lembrarias de tudo, és esquecido. Teu óculos ainda está na caixinha sobre minha mesa, mas não te lembras, nem do óculos e nem da mesa. Mais cedo ou mais tarde todos acabamos fugindo de algo ou alguém. Observar a vida sob essa perspectiva é como morar sem habitar; menos apegável, menos sofrível e mais suportável. Não entramos na igreja naquela semana. A luz nos vitrais sempre é a mesma, estando os espectadores lá ou não;


segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Insulina



Eu não sei mais escrever, corri um pouco hoje pela manhã, era frio, cedo ainda e a rua vazia de pressas; o vento passava por mim e não me encontrou, pouco senti. Café sem personalidade. Um gramado no sol naquele dia que não se deve dizer o nome, uma tarde com quem me precisa, um pouco de tempo de quem não tem relógio; a vida agora baseia-se no medo do mal que o doce traz, uma vida em potes de açúcares artificiais e agulhas. Uma epiderme marcada que não é a minha. Uma culpa marcada de impotência própria dos sentimentos maternos. Uma única história que eu teria preferido não escrever...