Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Placebo e água



Forço os dedos contra a pele, quero despir-me.. Sentir a  nudez escondida atrás dessa casca feita de  lugares ausentes e casacos que não param o vento. Quero a pele longe dos pelos e sem os medos que me seguram. Arrancar o que ficou impresso nas mãos, as marcas que  identificam, queimar o que sobra. Hoje o dia se fez de cores que não existem por depois da ponte, moram nessa nuvem que vem antes. Foi chuva e ainda não passou. Os outros estão na morada de madeira e chão gelado. Não podem sentir. Caminham e os passos podem ser ouvidos aqui nessa sala sem tapete. Fez frio. Não há lenha suficiente para queimar todas as memórias. Fica apagado. Os ponteiros do relógio sempre param antes do rio. Na estrada de plátanos podados as horas são medidas por cada folha amarela que encontra a terra úmida que parece um pouco com lama. É barro, nunca seca. Nunca cessa. Não dorme. É cinza e frágil apesar de dura. A música não chega até aqui, é sempre barulho de passos e vozes que não se reconhecem. Sons graves. Depois de amanhã vai ser dia de estar presente, já sem pele; ouvindo o estalar da brasa que queima por dentro do que já não serei, tentando curar o que sobrou. 

( Pai, me alcança um cobertor? )


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Coloque uma margarida nessa pulseira, vou gostar.