Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

segunda-feira, 4 de junho de 2012

O pó



Não tenho o que te dizer. Apenas um lamento por ser tudo antigo. Nada de novo não. O vento não muda nada por aqui. O hoje é o mesmo ontem fazendo-se de novo para iludir-se de amanhã. Mas é o mesmo dia velho. E na verdade não lamento por ser assim. Não lamento coisa alguma. Isso seria algo novo. Os outros continuam a passar na velha ponte. Cortam os mesmos galhos secos. Varrem as mesmas folhas caídas. Até a água da torneira de ferro parece enferrujada. Um emaranhado de impossibilidades. Uma estranha sensação de conhecer a voz do vento. Familiaridade criada através do medo do incomum. Pelo menos por aqui não posso reclamar da falta de linearidade.  Só o suficiente. Os farelos de casca de ovo cozido ficaram dentro da chaleira que nem chia mais. Alguém passou por aqui com fome. E não entendeu que casas velhas são sagradas. Não se deve mexer em nada. O passado nunca passa.





Um comentário:

  1. Não se deve mexer mesmo no passado. Postei antes no twitter, o saber pode confundir, até mesmo interferir no que sentimos. Por isso, o passado deve ficar lá, restrito.
    Um beijão. Adorei o texto.

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Coloque uma margarida nessa pulseira, vou gostar.