Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

domingo, 10 de junho de 2012

As amoras



 Chove tanto. Chove muito... Um dia inteiro choveu, molhou a noite. Penso ser tuas lágrimas essas gotas todas. Teus passos inquietos sobre a nuvem. Tu choras. A nuvem chove. 

  Sobraram algumas amoras no pote, tiro-as. Quero tuas lágrimas todas guardadas. Coloco cada gota dessa chuva no pote de amoras. Sem amoras. Só tua tristeza no frasco. 

  Já tenho três frascos de ti em água. Tuas lágrimas que foram chuva e agora guardo como amoras. Tu transparente. Te olho. Não posso deixar-te cair à terra. Estarias ainda mais distante. Vou perder-te assim. E tua tristeza parece não ter fim. Chove.

  Só chove, e é o último pote agora. Precisaria de mais tantos. Depois outros tantos... 

 Tenho as mãos molhadas. De ti, que não consegui guardar. Escorres. Não consigo-te inteiro. Tudo que és não pode caber em potes transparentes. Tudo que sinto também não. 

  Nunca vou poder colocar isso em frascos, onde antes cabiam amoras. Amoras doces. Que agora não tem morada. Como eu. Sem ti, sem potes e sem amoras. 

  Quero me fazer lágrimas também. Não tuas. Transparentes. A imensa nuvem cinza. Tu. Em água. Ainda chove muito. Chove tanto... 

Amor, transbordastes hoje. Agora dorme.






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