Aqui é onde a terra se despe
e o tempo se deita..

(Mia Couto, A Varanda do Frangipani)

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Todas as manhas


  Seus cabelos que lembravam chocolate com colheradas de mel, estavam presos naquele dia. Estava sentada no deck, com o olhar perdido em algum ponto da ilha, daquele café no cais a visão era deslumbrante. Usava um vestido quase da cor da sua pele, e o contraste com o cabelo escuro, formava uma cena delicada e minha vontade era tocá-la.
  Queria me aproximar, sentir seu perfume, tocar sua pele. Queria lhe falar, ouvi, olhá-la nos olhos, saber o que  procurava perdida naquela manhã.
  Não conseguia me mover até sua mesa, aqueles instantes pareciam preciosos demais para qualquer aproximação. Ela levantou-se. Olhava a água agora. Seu vestido era longo, leve, e naquele momento senti inveja dele. Ela a tocava, sentia. O vento também, e pude sentir seu perfume. Era a cena perfeita. Poderia ter morrido naquele instante.
  Pensei em me aproximar e lhe oferecer meu casaco, um café quente, um abraço... Imaginei que fosse delicada demais para aceitar qualquer que fosse minha oferta, eu com certeza a assustaria, ela estava só com seus pensamentos, distraída de todo em torno e concentrada em algo maior que tudo. Minha voz a tiraria de seu mundo, parecia belo. E eu não pertencia a ele, não era digno de estar lá.  Muito menos digno de importuná-la.
  Observei durante dias, meses até. Acho que durou exatamente uma estação. Ela transformou-se em algo necessário, algo diário.
   Na última vez que a vi, eu estava sentado, tomando café e observando-a. Ela levantou-se, caminhava lentamente em minha direção, parou ao lada da minha cadeira e disse:
  - Obrigada pela sua adorável companhia durante esse longo tempo. Adeus.
  Sua imagem ia sumindo em meio a neblina matinal, eu covarde; fechei os olhos imaginando que fosse possível mantê-la um pouco mais comigo... E a amei desde sempre.



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